“Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser. Que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver”

Amyr Klink

terça-feira, 27 de março de 2012

Capivaras - The Paradise

 Segunda semana do mês de março de 2012, fiz uma visita ao meu amigo Rovani, conversamos um pouco e o principal assunto era embarcações e navegadas. Não poderia ser diferente entre dois amigos apaixonados por atividades náuticas. Há quase 2 meses sem navegar por estar focado nos estudos para garantir minha vaga em um concurso público, já estava com bastante saudade da água e dos barcos. Comentando sobre minha ansiedade e crescente vontade de velejar , o Rovani se mostrou disposto a uma velejada no final de semana que se aproximava. Ele já foi logo sugerindo uma velejada mais longa , como ir até São Lourenço do Sul. Eu já havia velejado até lá com nosso amigo Alberto Blank. Uma velejada muito interessante , de 3 dias , que foi planejada com mais tempo de antecedência. Faltava apenas alguns dias até o final de semana e eu trabalhando dois turnos todos os dias tinha pouco tempo disponível para um planejamento maior. Comentei sobre minha vontade de atravessar a Lagoa dos Patos até Capivaras ( São José do Norte) e perguntei o que ele achava. Ele topou com certo entusiasmo e quando eu estava indo embora a pergunta dos dois era: "tá , mas nós vamos mesmo?". Foi ele quem perguntou , mas eu também tinha ela em mente. A bastante tempo eu tentava velejar com o Rovani , mas nunca conseguia devido a incompatibilidade do nosso tempo livre para a atividade.


Porque "recordar é viver"

Uma frase clichê que muito se ouve , mas que é verdadeira. Recordar bons momentos que vivemos , que nos marcaram , visualizando fotos, vídeos e na memória os acontecimentos com riqueza de detalhes é como viver de novo aqueles momentos. 


Foi com o Rovani que comecei a praticar atividades náuticas. Tudo começou com pranchas de bodyboard pegando ondas no mar, depois um pequeno bote inflável que garantia a diversão nos finais de semana, não demorou muito até que comprássemos juntos nossos primeiros caiaques e partíssemos para pequenas expedições.





Mesmo em um pequeno bote inflável , a diversão era garantida na barra do canal São Gonçalo.

Foto by Rovani M. Amaral.


Uma das mais belas fotos que tenho na água. Feita pelo Rovani durante nossas primeiras remadas de caiaque em dezembro de 2007. Virou plano de fundo deste site. 



Vela no caiaque ( Criação do Rovani)
Rovani e Emerson ( Nino)

Após várias remadas curtas explorando o arroio Pelotas e partes do canal São Gonçalo, nossa sede por aventura só aumentava. Em fevereiro de 2008 o Rovani me convidou para uma remada de 60 km no São Gonçalo, de Santa Isabel a Pelotas.  








 


                                               



Essa remada pode ser insignificante e pequena para muitos se comparada a outros acontecimentos, mas não para mim. Quando o Rovani fez o convite topei na hora , mas eu duvidava que conseguiria completar o trajeto , visto a minha vida sedentária. Quando chegamos a Pelotas eu vi que era possível sim e um sentimento de satisfação e felicidade tomaram conta de mim porque eu sabia que outras viriam com essa parceria. Essa remada marcou meu abandono da vida sedentária, primeiro acampamento e também reforçou os laços de amizade e parceria entre eu e o Rovani. 

Mais fotos podem ser vistas no link abaixo:

No ano seguinte eu e o Rovani combinamos nossa primeira travessia da lagoa dos Patos até São José do Norte , passando pela ilha da Sarangonha, de caiaque. Travessia essa que ja vinha sendo planejada por alguns amigos canoístas a algum tempo , mas que não tinha sido feita ainda devido a fatores climáticos adversos. Escolhemos o dia perfeito para a travessia; Ausência de vento durante a ida , deixando a lagoa calma e espelhada, e vento à favor no retorno proporcionando belas surfadas nas ondas e chegada mais rápida. 
























Mais fotos no link abaixo:

Outras aventuras também interessantes fizemos, como uma remada até a ilha da Feitoria onde conhecemos a única família que ainda mora lá. Subida do arroio Pelotas do Recanto de portugal até a Ponte da Galatéia , na estrada do cotovelo, entre outras. Essa amizade e parceria ainda vai render muitas aventuras. Os pontos de interesse mais próximos ja foram explorados e a tendência é de essas aventuras nos levarem cada vez mais a locais mais distantes. 


Sailing to Capivaras


Pelotas, 17 de março de 2012, manhã de sábado , lindo dia ensolarado, eu me preparava para a velejada combinada com o Rovani, na Lagoa dos Patos, no último final de semana do verão.O objetivo era partir da prowind, na praia do laranjal e atravessar a Lagoa até Capivaras , São José do Norte.  Cheguei na prowind perto das 10h e comecei a limpar e montar o Hermes ( Ipanema 13), tudo sem pressa porque tinha que esperar o Rovani que aceitou meu convite para essa velejada e estava resolvendo alguns problemas pessoais. Na prowind encontrei o amigo Vinícius Constenla que prontamente me ajudou com a limpeza do barco e abertura das tampas de inspeção que estavam travadas. Em seguida levei o Hermes e os equipamentos para a beira da praia e iniciei a montagem. Enquanto eu preparava ele , outros dois monotipos foram para a água. Ajudei os outros velejadores a colocar os barcos na água e um deles retribuiu me ajudando na colocação do mastro que como usa 'estais' é difícil de mastrear sozinho. Próximo ao meio dia , o amigo Alberto Blank me ligou e foi até a praia. Conversamos um pouco , ele me deu algumas dicas sobre bancos de areia, andanas , canaletes, local de acampamento e ainda propôs me mostrar com detalhes na carta náutica. Acabei dispensando essa última por ter uma carta náutica com um nível de detalhamento interessante no GPS. É muito bom ter o apoio de amigos antes de novas aventuras , ainda mais em locais desconhecidos por mim. Até pouco tempo atrás eu percebia mais expressões de preocupação nos amigos quando eu falava dos planos de navegação. Ultimamente tenho percebido um pouco mais de confiança dos mais preocupados. Tenho pouca experiência ainda no mundo da vela , mas tenho voltado para a casa , junto com quem me acompanha , em segurança. Posso não extrair o máximo desempenho que a embarcação pode oferecer, não fazendo a melhor trimagem das velas , nem escolhendo os melhores rumos, cometendo pequenos erros , naturalmente , mas nada muito significativo , que comprometa nossa segurança. Em pouco mais de um ano velejando ainda não solicitei resgate ou outro tipo de apoio externo durante as velejadas, mesmo sabendo que isso ainda pode acontecer e que acontece inclusive com os mais experientes. O importante é que tenho aprendido , principalmente com os erros.
Por volta das 13h o barco estava montado e carregado. Eu estava somente aguardando o Rovani chegar para colocar o Hermes na água, içar velas e partir. Rovani chegou as 13h45min , com a mulher dele ( minha prima Tatiane) e filho Tiago ( meu afilhado). Tiago com apenas 5 anos é apaixonado por barcos e água. Subiu no Hermes e queria ir para a água. Ele já remou de caiaque wave, mesmo com seu pouco tamanho , "escondido" no cockpit , segurando o remo e executando a remada de forma correta. Esse em pouco tempo estará velejando também.




Tudo pronto, içamos as velas , colocamos o Hermes na água e iniciamos nossa velejada por volta das 14h 30min. Saímos em um contra-vento folgado , aproados à ilha da feitoria , poucos minutos após nos afastarmos do trapiche e atingirmos profundidade suficiente para baixar toda bolina , cambamos rumo à ponta rasa e mantivemos esse bordo até São José do Norte. Foi uma travessia tranquila, só cambamos novamente em frente ao local de acampamento, para aproximação.










Nosso GPS track pode ser visto na imagem abaixo:





Abaixo montagem com vídeos e imagens da nossa velejada:

Para visualizar com mais qualidade, sugiro abrir o vídeo através do seguinte link: 








Chegamos próximo ao local escolhido para o acampamento por volta das 17h. Foram aproximadamente 2h e 30 minutos de velejada. Nos admiramos com a beleza do local , águas transparentes , temperatura agradável, dunas de areia com uma bela mata de pinus. 


 Velejamos até quase encalhar. Desembarcamos e puxamos o Hermes até a areia. Fizemos algumas fotos e fomos explorar as dunas.
(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)



"Água-viva"




Rovani na parte mais alta das dunas ( +ou- 20 m de altura ,segundo informações do GPS)




(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)


(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)


Um dos pontos mais bonito e interessante de se observar a Lagoa em que já estive.  


(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)
Hermes, o pequeno e marinheiro veleirinho ficou menor ainda lá atrás. 

(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)





(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)


(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)


Na foto acima o Rovani correndo em direção ao Hermes que estava sendo vasculhado por cães à procura de alimento. 


(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)

(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)


Após uma caminhada nas dunas, voltamos ao Hermes e o puxamos até o local escolhido para acampar. Tinha muita umidade no local , movemos novamente o Hermes até outro local e montamos acampamento em um ponto mais seco. 






Fomos recebidos no local pelos mosquitos que não fizeram "cerimônia" ao se alimentar do nosso sangue. Foi um ataque em massa. Nesse momento lembrei-me que o repelente ficou em casa. Em poucos minutos eu já estava coberto de caroços pelo corpo. O Rovani não sentiu tanto , pois não é tão alérgico como eu. Eu sentia tanta coceira que não conseguia parar de me coçar. Enquanto o Rovani montava a barraca e providenciava o fogo, tomei anti-histamínico e corticoide para diminuir a reação alérgica e fui novamente até as dunas apreciar o pôr do sol e o anoitecer.




 Esperando o anoitecer já com a Headlamp na cabeça. 
As luzes da cidade de Rio Grande. 



Anoiteceu quando eu estava voltando para o acampamento e eu não estava vendo o Rovani. 
Ele ainda não tinha feito o fogo. Escutei barulho na água , apontei o foco de luz e vi o Rovani correndo na fina camada de água atrás dos peixes. Sujeito de sorriso fácil que realmente se diverte com coisas simples. Assim se vive mais e melhor. 






Enquanto eu tomava banho ele fazia o fogo. 


(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)
A fumaça afastou um pouco os mosquitos e deixou o acampamento mais agradável.




Alimentos não faltaram. Tomamos um café com pão, carne com molho, Salsichão, Wafers, salgadinhos , bolo e ainda preparei um macarrão que o Rovani sinceramente falou: "Eu não vou comer esse grude". Entre risadas , fartos de tanto comer , quase finalizamos até o "grude". 





Coloquei minhas sandálias para secar a aproximadamente 1m do fogo. O vento mudou de direção , o fogo aumentou e se aproximou das sandálias , derretendo parte delas. Quando o Rovani me mostrou as sandálias derretidas caímos em gargalhadas. Tudo era motivo de risada depois de uma bela navegada em um dia bastante agradável.  
Não tínhamos onde amarrar o Hermes, então o encalhamos e levamos a corda que estava presa ao cunho , na proa, para dentro da barraca e a amarramos em um pote grande. Durante a madrugada o nível da água subiu e acordamos com a corda correndo para fora da barraca. Era a água levando o Hermes. Puxamos ele um pouco mais até encalhar novamente. 


Manhã de domingo, o sol brilhava forte , o vento era fraco e a temperatura agradável. Após tomarmos café da manhã, explorarmos um pouco mais o local, começamos a levantar acampamento e nos preparar para o retorno. 








Resina sendo extraída dos pinheiros. 








(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)


Saímos do acampamento em direção a vila de pescadores , somente navegamos em frente a vila , não desembarcando para explorá-la . 


(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)
Salgas em palafitas na vila de pescadores em Capivaras. 


(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)


No retorno , próximo a Ponta Rasa pensamos em aproar à ilha da Sarangonha e contornar ela, mas começamos a pegar alguns baixios e com vento mais forte e ondas que não deixavam a velejada confortável como no dia anterior , mudamos de ideia e cruzamos a lagoa direto em direção a Pelotas.  


(Crédito da foto: Rovani Magalhães Amaral)


Chegando na praia do laranjal com vento em popa , a raia da prowind estava limpa, então decidi velejar até a beira da praia. O Hermes surfava as ondas ganhando bastante velocidade.O Rovani ficou um pouco de pé brincando de surfista.  Em seguida ele levantou um pouco a bolina pois estava ficando raso e voltou a se posicionar no meio do barco. Descendo uma das ondas acabei arribando um pouco acidentalmente e ocorreu um Jibe não desejado. A retranca não encontrou nenhuma cabeça pelo caminho pois estávamos ligados , mas o contra-amantilho ( burro) encontrou a bolina levantada e a vela não trocou de bordo, ficando alinhada com o barco e sendo atacada pelo vento fazendo o barco adernar rapidamente e quase capotarmos . Nos projetamos rapidamente para barlavento e o barco não capotou, mas "tomou" muita água. Rovani de frege como sempre se atirou na água em seguida e eu segui navegando com o cockpit inundado. Consegui soltar o burro da bolina e continuei em direção a beira da praia. Orcei em seguida e deixei as velas panejando. Desembarquei e comecei a tirar água do cockpit. Eu gritava do barco : "Filho da P*#@ me deixasse sozinho" e escutava a risada do Rovani que se aproximou e me ajudou a esgotar o barco. Minha mãe estava na praia junto com meu primo Sandro , mulher dele Tatiane e filho Lucas ( meu afilhado). Lucas entrou na água para nos ajudar. Minha mãe se aproximou também e nós naquele clima de frege demos uma banho nela com o pote de esgotar o barco. Rimos bastante , mas ela não ficou muito feliz. Fizemos a rotina de desmastrear o barco, carregar equipamentos e guardá-lo na prowind. Fomos para a casa bastante satisfeitos com a velejada e já pensando nas próximas que serão literalmente mais geladas com a proximidade do inverno. 
Agradeço o amigo Rovani pela parceria nessa velejada e todos os outros amigos que direta e indiretamente nos apoiaram. 
Grande abraço a todos e Bons ventos!


Anderson Chollet.